30 de jun. de 2011

RUIDO NA COMUNICAÇÃO.

Aqueles que são dados a estudos teóricos da comunicação - não confundir com comunicações, que se atém aos meios e não à atividade, esta sim voltada ao relacionamento intersocial – sabem o que vem a ser ruído na comunicação e a confusão que ele causa nos relacionamentos. Ruído na comunicação não é a mesma coisa que ruídos nas comunicações, estes representados por aquela interferência que prejudica o entendimento de que ouve alguma transmissão à distância, e aqueles pela incapacidade dos interlocutores se entenderem mutuamente. Pronto, agora já demonstrado explicitamente que meu diploma em Comunicação Social não foi comprado e nem tirado “nas coxas”, vamos ao que interessa.
Em meados do século passado (Nossa, como o tempo voa!), recém saído da AMAN, fui servir com Aspirante a Oficial, aí em Uruguaiana, no Oitavo RC. Junto comigo foram o Luiz Carlos Molina – de Intendência, o Gabriel Garcia – de Artilharia e mais alguns outros, sendo eu o único de Cavalaria. Logo em seguida, chegaram alguns Aspirantes R/2 e entre eles o cavalariano paranaense, Altino Traple com de quem me tornei amigo em pouco tempo. Mas historia que iria contar era outra...
Num daquele dias frios e chuvosos do nosso inverno, à tarde logo depois da limpeza da cavalhada, que era feita logo após o almoço, na impossibilidade da instrução ser dada ao ar livre aos pelotões foi determinado que fosse ministrada instrução teórica de comunicações nas respectivas reservas de material.
Era comum naquele tempo que fossem convocados para servir na tropa de fronteira recrutas de todo o estado inclusive da região das colônias italiana e alemã. Como ainda existisse nada mais abrangente de que o radio, e isso mesmo só nas cidades, era comum chegarem recrutas que mal e mal sabiam se expressar num português capenga (E ainda o MEC não havia editado sua malfadada cartilha dos analfabetos), outros mais havia que somente falavam a língua dos seus pais e avós.
Um desses apedeutas veio cair no pelotão do Traple. O cara só falava alemão e entendia muito pouco o português. Seu nome: Wilmo, que ele pronunciava Vilmur e, pasmem o rapaz de alemão não tinha nada. Era negro, mas nascido e criado, acho que, no interior do município de Frederico Westfallen. Falo isso para que entendam porque o coitado estava, como se diria, sempre mais por fora do que asa de xícara em qualquer cross de banquinho, que era como chamava-mos a instruções ministradas em recinto fechado.
Quem já ficou confinado numa sala onde se guardam selas, arreios, barracas, material de couro e outros petrechos campeiros sabe bem do poder inebriante do bodum emanado daquela mistura, ainda mais aliado a uma fraca iluminação e a voz monocórdia do sargento que, na verdade, não deveria estar ministrando a instrução, mas estava substituindo temporariamente o Traple que havia saído em busca de um cafezinho para espantar o seu sono.
A instrução era sobre meios de comunicação do regimento, mais especificamente sobre rádio. Retornando ao pelotão Traple não quis interromper a aula do sargento e ficou um prestando atenção aos seus recrutas. Como a palestra já ia adiantada o oficial resolveu interrogar seus comandados para aquilatar seus progressos no assunto.
Sentado numa capichama, encostado num cavalete o Wilmo travava uma luta inglória contra o sono que teimava em fechar-lhe os olhos. Estremunhado ouviu o Traple perguntar a um seu colega:
- Soldado, de que está sendo esta instrução?
- Desculpe tenente, mas eu não estava prestando atenção
Rápido o Traple sentenciou:
- Sargento põe ele detido no fim de semana.
O Vilmur podia não saber o que estava acontecendo, mas detenção ela sabia bem o que vinha a ser.
O Tenente voltou-se para outro reco:
- Tu ai sabe do que é a instrução?
- Sei, é de rádio, seu tenente.
- Muito bem! E quantos tipos de rádio existem no regimento?
- Sei não, senhor.
E lá se foi mais um para o pernoite... E o tenente voltou à carga:
- Quem sabe? Um mais afoito se expôs:
- Eu sei!
- Ta bom, diz logo...
- Três, são três.
- Quais são eles?
- Ah, isso eu não sei...
- Ta bem, mas pelo menos sabe quantos eram... Mas quais são? Quem sabe?
O tenente passou os olhos pela turma e descobriu o Wilmo lá no seu cantinho.
- “Seu” Wilmo, sabe quais são os três tipos de rádio do quartel?
Para surpresa geral o Vilmur mandou:
- É três: É “erradio” faltar o serviço... É “erradio” responder prô sargento... É “erradio” não tomar banho.

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